A escultora Leda Gontijo inaugura exposição na galeria do Minas Tênis Clube, às 20h de 8 de março. É um belo acontecimento para celebrar o Dia Internacional da Mulher, disse o secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo. Segundo ele, “a artista completa cento e um anos e tem uma vitalidade admirável, trabalhando diariamente no ateliê em Lagoa Santa”. O secretário fala mais sobre Leda Gontijo no texto abaixo.
A escultura de Lêda Gontijo
Angelo Oswaldo de Araújo Santos
Secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais
Lêda Gontijo esculpe, entalha, pinta e ornamenta suas obras. Tendo à frente a paisagem que suspende a Serra da Piedade por sobre a Lagoa Santa, ela se dedica intensamente ao trabalho. A Torre de Guinigi é uma fotografia na parede da casa mineira para evocar a Lucca ancestral. As esculturas ali se multiplicam, à espera da exposição que marca o centenário da artista.
“Não sei se sou artesã escultora ou escultora artesã”, indaga Lêda Gontijo a si mesma, enquanto caminha por entre as obras espalhadas no recinto do ateliê. Ela própria reconhece as dimensões do artesanato, na lida direta com as formas orgânicas, tanto quanto percebe a essência da escultura, nas lições da mão que faz, ágil e firme, instruída pelo desejo de criar e guiada pela vontade de retirar da matéria as pulsações da vida.
Lembra um ensaio do filósofo Hans Ulrich Gumbrecht que a intensidade da experiência estética leva à “presença energética” dos objetos, alcançando estes, na profusão do acontecimento, os efeitos diversos que o sentido pode produzir. A aura da arte está cifrada na escultura, e a luz do fazer criativo impregna o artesanato. São signos estéticos dotados de grande vigor. Arte e artesanato se encontram no limite do fazer técnico, numa fronteira que inexistia à época do Renascimento, quando artista e artesão eram um só. Como Lêda Gontijo.
Nos bichos, sobretudo, o corte artesanal plasma plenamente a transformação da madeira. Nas figuras populares, insurge, igualmente, o gênio da artesã, com a espontaneidade e a originalidade plásticas de um Véio, escultor do Nordeste, ou de um Virgínio Rios, de Cataguases, no tratamento, melhor dizendo, no diálogo com os troncos de árvore.
Lêda Gontijo conversa, bem humorada, com as formas naturais. Lêda de arte leda, disse Ziraldo. Uma revoada de anjos barrocos enrodilha-se num galho de árvore, enquanto mulheres hieráticas brotam da pedra, em sereno colóquio. Imagens da fauna e da flora, por entre curiosas figuras humanas, revelam a alegria da autora ao lançar seu gesto criador a fim de repovoar o espaço com a magia da arte e celebrar a vida. Grande tenista, a destreza e agilidade na prática do esporte associam-se ao simultâneo domínio da mão criadora.
Mineira de Juiz de Fora, descende de italianos pelo lado paterno – Selmi Dei –, mas a família de sua mãe se enraíza no mesmo chão mineiro de que brotou a inteligência prodigiosa do primo Pedro Nava, ambos pertencentes ao clã histórico dos Pinto Coelho das velhas cidades do ouro, nas quais reinou o legendário barão de Catas Altas.
Aluna de Guignard, que pintou o teto da sala de jantar de sua casa da rua Caraça, em Belo Horizonte – felizmente preservado pelo edifício que tomou o lugar da residência –, ela desde sempre dedicou-se à escultura figurativa. Francisco, o santo de Assis, está presente em momentos marcantes de sua produção.
A exposição, organizada pelo curador Paulo Rossi, comunica ao expectador a criatividade da artista e o dinamismo com que, aos cem anos, funde vida e arte tal como confere transcendência à realidade. Não é uma retrospectiva, mas a reunião de obras da atualidade. Lêda Gontijo celebra o fazer, certa de que a arte não tem fim.