Uma exposição sobre a cadeira, desde o móvel popular ou erudito manufaturado até o design industrial, é vista no Museu de Artes e Ofícios, na Praça da Estação, em Belo Horizonte. Organizada pelos curadores João Caixeta e Fabiano Lopes, a mostra reúne cadeiras dos séculos 17, 18, 19 e 20, compreendendo também exemplares da atualidade. Os móveis perfazem uma narrativa histórica e artística, pela qual os estilos se sucedem, fazendo de cada cadeira o símbolo de uma época. Variadas coleções cederam peças para o conjunto, no qual se destaca o núcleo inicial do futuro Museu da Cadeira, em organização em Belo Horizonte. O patrocínio do evento é da FIEMG, mantenedora do Museu de Artes e Ofícios.
O secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo, assina o texto de abertura da exposição, que segue abaixo.
Arte e ofício da cadeira
Angelo Oswaldo de Araújo Santos
Secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais
A cadeira é arte e ofício. É convite a se assentar e conversar. Ela própria conta a história do homem e da mulher, desde o remoto tempo em que se puseram de pé e quiseram descansar. Uma pedra côncava ou um tronco de árvore teriam sugerido a primeira. As mais diversas atividades foram desenhando cadeiras peculiares. Sentar e fazer. A curul tornou-se símbolo de poder, a cátedra, da dignidade do saber, e o trono, de majestade. Os respaldos, quanto mais elaborados, passaram a definir não só a utilidade e a simbologia do móvel como a sua época e os respectivos estilos.
A cadeira desceu das caravelas para multiplicar-se nas infindáveis versões ensejadas pela prodigalidade da madeira da terra do pau brasil. A partir dos modelos portugueses, e das variações neles introduzidas pelo mobiliário oriental, graças à presença lusitana na Índia, na China e na Indonésia, a cadeira brasileira passou pela mão africana e alcançou formas tão genuínas como os assentos zoomórficos dos nossos indígenas, graciosa na simplicidade e elegante no requinte.
A cadeira filipina de pé de bolacha, a joanina de espaldar curvo, a Dom José ou a Dona Maria, a de medalhão Luís Felipe, todas tiveram interpretações vernaculares que evidenciam a surpreendente inventividade da mão do povo. Minas Gerais particularizou-se no país, por ter ensejado a formação da primeira sociedade urbana, cuja influência se prolongou nas dimensões do mundo rural dilatado após o ciclo do ouro. Daí a proeminência do móvel mineiro no contexto nacional.
Da oficina de Antônio Francisco Lisboa, Aleijadinho, procedem as cadeiras de cônego e o trono episcopal vistos no Museu Arquidiocesano de Mariana. Do Senado da Câmara de Sabará, remanesce no Museu do Ouro notável cadeira de assento e espaldar de couro lavrado. Geométricas e marchetadas, as cadeiras Dona Maria I encerram a série de móveis apresentada pelo Museu da Inconfidência, em Ouro Preto. Cadeiras furadas com compartimento para vasilha sanitária aparecem no Museu do Diamante, em Diamantina. Nobres exemplares do Segundo Reinado comparecem ao Museu Mariano Procópio, em Juiz de Fora. De gosto eclético, as cadeiras da primeira Belo Horizonte se preservam no Museu Abílio Barreto ou no foyer da Sala Minas Gerais, salvas do descarte ensejado pela Cidade Administrativa.
O século XX instigou a criatividade do design. As lições de Joaquim Tenreiro, por sobre a matriz portuguesa, foram decisivas para o abrasileiramento das linhas advindas da Bauhaus e do modernismo europeu e norte-americano, reinventadas com talento e surpresa. Sérgio Rodrigues, Lina Bardi e Oscar Niemeyer assinam cadeiras hoje museológicas. Três de uma que se deve a Lúcio Costa estão na presidência do IPHAN, em Brasília.
No Museu de Artes e Ofícios, entremeado de referências ao tema, abre-se a exposição organizada pela equipe do Museu da Cadeira, em implantação em Belo Horizonte. Cada cadeira é um capítulo da nossa história. A iniciativa tem relevo especial para o patrimônio artístico e histórico do estado e do país, constituindo-se em esplêndida realização do diálogo que a FIEMG promove entre o mundo do trabalho e o universo da cultura.